Quatro horas de viagem é o tempo que passei no ônibus ao retornar de Santa Maria na volta do fim de semana. Resolvi fazer algo de útil nessa viagem e pensei. E pensando sobre a minha vida percebi que nem sempre poderei voltar a ser criança quando sentir saudades. Agora é assim: eu durmo no quarto dos meus avós quando vou visitá-los nos fins de semana e feriados. Lá naquele quarto me sinto protegida. É o lugar onde me sinto mais segura. O sono vem fácil. Durmo tranquila e acorda descansada. Como quando eu era criança. Ainda posso deitar do lado da vó quando o vô se levanta. Fico uma hora ali deitada na cama deles com ela. E esta é uma das coisas que me fazem mais feliz. Mas essa deliciosa vida lúdica de rápido retorno da infância e meus sábios e carinhoso avós um dia vão embora. Não creio que cedo, porque foi com aquela mulher magrinha e pequena de 78 anos que aprendi a ser forte. Mas a doença dela e as aflições que meu avô compartilha comigo me fizeram ver que minha infância já acabou. E adolescência, que pode ser vista com uma ilusão que nos conforta quanto ao fim da infância, também acabou. Mesmo após essas doses de ludismo e felicidade que os momentos com eles me trazem, no fundo sei que cresci. É , eu sou adulta. Como tanto quis um dia ser.
É, eu já não me sinto confortável com meu pai pagando minhas contas. Eu até já me preocupo com a saúde dele. E eu não me sinto bem em novas experiências, algumas até me assustam. Antes vivia sempre em busca de novas experiências, agora busco mais experiência. Volta e meia, alguém da minha idade, que eu já vi em algum lugar, morre. É, pessoas da minha idade morrem. Quando eu era criança ninguém comentava no colégio sobre a morte de algum colega. E eu já não me fecho em ambientes com pessoas desconhecidas. Minha conversa flui e até saio dali com a sensação de que fui simpática. Reparo mais no assunto das pessoas do que na roupa que elas vestiam. Sento a uma mesa de bar e fico horas falando sobre a vida preofissional, sem achar o papo chato. Pelo contrário, adoro falar de jornalismo! Também dou conselhos amorosos tomando como base os relacionamentos que tive, não mais o que imagino. Não falamos mais em "príncipe encantado", mas em "achar um cara legal". Não revelo coisas a minha família, escondo coisas de amigos, guardo coisas só comigo. Há coisas que só são ditas em família, outras só com alguns amigos. E tenho segredos que são só meus. Penso no futuro daqui a vinte anos na mesma proporção que penso nas obrigações da semana.
Tenho agenda! Tenho agenda, e ela não serve só para me lembrar datas de aniversários. Tenho agenda e a uso para lembrar contas, reuniões e a lista de comprar do supermercado. Como frutas e verduras. Gasto dinheiro comprando frutas e verduras. Ainda compro danoninho e toddynho , confesso. Mas eles ficam no mesmo carrinho do papel higiênico, desinfetante, frutas, carnes e até do chá. Sim, eu bebo chá quente a noite e adoro isso. E também descobri que não tomamos bebidas alcóolicas só quando queremos ficar bêbados. Às vezes é maravilhoso saborear uma taça de vinho antes de dormir. E eu já não tennho vergonha de comprar pílula anticoncepcional. E pensar que já tive vergonha de comprar absorventes. Aliás, falo de menstruação com a mesma naturalidade com que falo de filmes. E gosto de ver filmes sozinha, às vezes.
E eu cresci mesmo. Mas adoro o colo dos meus avós e o sorvete que meu pai compra. Mesmo que no dia seguinte eu esteja bebendo vinho com eles enquanto discutimos política. Ser adulto nada mais é que nunca deixar morrer a criança que fomos.
Um comentário:
Catita,
tb passo por essa crise e concordo num monte de coisa.
mto bom passar um final de semana com a família, meu lugar do mundo!
Ah, adoro chá tb. Nesse frio então
Postar um comentário